A redução das passagens de ônibus em Maceió se sustentará?

Por Edberto Ticianeli

Foto de Déborah Moraes do Alagoas24Horas

Desde as bigas romanas que os empresários concessionários dos serviços públicos de transportes urbanos pleiteiam o aumento do valor das passagens de ônibus.

Na outra ponta dos transportes urbanos, os usuários reclamam do alto preço das tarifas e dos péssimos serviços prestados.

Como diz um ditado popular, negócio em que os dois lados estão insatisfeitos tem tudo para dar errado.

Acredito que a raiz desse problema está no modelo de concessão.

Quando o empresário se habilita a explorar esse serviço, é garantido a ele o chamado “equilíbrio do sistema”, ou seja: como é um negócio, o poder público não pode tomar nenhuma medida que traga prejuízo aos concessionários.

Mas há outro “sistema” que também não quer ficar “desequilibrado“. É o da população que injustamente gasta 20% do seu salário-mínimo com transporte público, como identificou o estudo da Numbeo em 2020.

Surge então a eterna queda de braço, com vantagem, é claro, para os empresários, que têm maior poder de pressão e convencimento para conseguir seus interesses.

Aos usuários sobra, de vez quando, uma explosão de descontentamento com algumas conquistas.

Foi nesse imprensado que o prefeito João Henrique Caldas se meteu ao determinar que a partir de 25 de janeiro as passagens teriam seu valor reduzido para R$ 3,35.

Histórico recente dos valores da passagem em Maceió

Em fevereiro de 2017, a tarifa passou de R$ 3,15 para R$ 3,50. No início de 2018 foi para R$ 3.65.

Permaneceu com esse valor, congelada, durante 2019, após proposta do Ministério Público Estadual (MP-AL) acatada pelo prefeito Rui Palmeira.

Em 26 de dezembro de 2019, o Conselho Municipal de Trânsito de Maceió aceitou o pedido dos empresários e aprovou o aumento da passagem para R$ 4,10.

Nos primeiros dias de 2020, Rui Palmeira anunciou que manteria a tarifa congelada em R$ 3,65 e acusou as empresas de ônibus de descumprirem os contratos do serviço licitado desde 2015.

Os empresários responderam alegando que não atendiam os compromissos por haver desequilíbrio financeiro na relação contratual.

O prefeito queria a renovação da frota e a quitação de débitos com a outorga das concessionárias e com impostos municipais. Em 2018, essa dívida tinha ultrapassado R$ 23,7 milhões.

Questionamentos sobre a redução

Quem primeiro demonstrou preocupação com os possíveis desdobramentos com a redução do valor da passagem foi o secretário estadual da Fazenda, George Santoro, que publicou nas redes sociais suas dúvidas:

“Gostaria de conhecer o estudo da Prefeitura de Maceió que lastreou a redução das tarifas de ônibus. Curiosidade acadêmica, pois preços de insumos cresceram muito: combustíveis. Que bom para população. Espero que a redução não vire subsídio pago pelo contribuinte”.

Ontem (25), o promotor de Justiça Jorge Dórea foi na mesma toada e solicitou que o atual prefeito apresentasse, em 48 horas, o estudo em que se baseou para reduzir o valor da passagem na capital.

Ele explicou que agiu assim por imposição legal, da mesma forma que procede quando há aumento: “É preciso saber as razões técnicas que fundamentam a redução, como forma de avaliar seu impacto no equilíbrio econômico e financeiro dos contratos de concessão”.

Até a publicação deste texto, não se tornou público qualquer justificativa ou estudo pelos órgãos municipais, como também não houve protesto algum por parte dos empresários.

Coincidentemente, quem agitou o setor foi o Sindicato dos Trabalhadores em Transportes Rodoviários no Estado de Alagoas (Sinttro/AL), que anunciou a possibilidade de paralisação dos motoristas a partir da próxima semana.

A categoria está insatisfeita com os atuais salários e cobra reajuste, alegando que isso não acontece desde 2019. Quer também o pagamento de tickets de alimentação e planos de saúde.

O Sindicato divulgou ainda que realizará assembleias entre esta terça-feira (26) e a sexta-feira (29), com atraso da saída dos veículos das garagens, que somente circularão a partir das 7 horas, conforme a seguinte programação: Terça-feira (26) – São Francisco; Quarta-feira (27) – Cidade de Maceió; Quinta-feira (28), Real Alagoas e Sexta-feira (29), Veleiro.

Os líderes da categoria já divulgaram que se os patrões não atenderem aos pedidos, será decretada greve a partir de segunda-feira, 1º de fevereiro.

Essa justa reivindicação dos motoristas inevitavelmente irá municiar os argumentos dos empresários para impedir a redução do valor da passagem e até para reivindicar algum aumento. É possível que seja travada uma batalha nas barras da Justiça.

O prefeito João Henrique Caldas divulgou exaustivamente seu feito, mas pode ter sérios problemas pela frente.

Torcemos para que consiga permanecer com as tarifas reduzidas e que também convença os empresários a manterem o sistema em funcionamento numa situação de desequilíbrio.

Entretanto, os resultados anteriores das incontáveis quedas de braço desse tipo indicam que dificilmente a redução se sustentará.

Edberto Ticianeli

Jornalista e Produtor Cultural. Ex-secretário Estadual de Cultura. Editor dos sites História de Alagoas e Contexto Alagoas.

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