Costa Rego e a condecoração inconstitucional

Edberto Ticianeli

Reconhecido por não ser um grande orador, Costa Rego usava e abusava de sua inteligência, argúcia e humor causticante para vencer obstáculos e enfrentar adversários.

Em 1919, quando ainda era deputado federal e secretário da Mesa Diretora da Câmara, ficou chateado com o vice-presidente da casa, o maranhense Artur Quadros Colares Moreira, que havia dado um parecer carregado de hermenêutica contra suas pretensões em projeto de sua autoria.

Como precisava acertar as contas com ele, o interceptou no exato momento em que deixava a mesa durante uma sessão no Palácio Monroe, no Rio de Janeiro.

Jornalista Pedro da Costa Rego

Anunciou ao velho político que queria tratar com ele de um assunto muito sério, com importantes repercussões políticas e que poderia causar uma crise internacional.

Explicou ao colega que a Constituição de 1891 vedada o recebimento de condecorações estrangeiras por deputados.

Colares Moreira, intuindo que Costa Rego estava prestes a ser homenageado e pretendia receber o seu aval, esboçou um ar de riso e aguardou a conclusão da solicitação para negá-lo, com prazer.

— O fato é que estamos recebendo na Mesa condecorações do Rei Alberto, que quer demonstrar seu reconhecimento aos congressistas brasileiros que se colocaram ao lado da Bélgica, contra a invasão alemã —, esclareceu Costa Rego.

— E você recebeu alguma? — se apressou a perguntar Colares Moreira, pronto para desaconselhar o recebimento de tal distinção.

Costa Rego, que preparava a arapuca, disse que não e devolveu a pergunta:

— E você?

Quase que se sentindo insultado, o vice-presidente da Câmara esbravejou que não receberia tal comenda, pois o texto constitucional era claro. Além disso, não arriscaria perder o mandato e a cidadania por causa de uma homenagem.

Diante de tal convicção, Costa Rego, que escondia uma das mãos nas costas, apresentou um envelope ao colega e se desculpou por não ter entregue antes aquela correspondência.

Colares rompeu o invólucro e descobriu que era a condecoração enviada pelo Rei Alberto para ele. À sua frente, Costa Rego exibia um largo sorriso malicioso, que somente se desfez quando perguntou:

— Então? Vai devolver?

Colares Moreira se contorceu, pensou e respondeu:

— Eu não sou um mal educado, por isso não devolvo.

— Mas e a Constituição? E a cidadania? E o mandato?

O ilustre homenageado ainda conseguiu justificar que não devolveria, mas a guardaria sem usar, alegando que a Constituição não proibia guardar a condecoração.

Diante dos argumentos absurdos e deixando claro que o hábil político estava sendo incoerente, Costa Rego deu o tiro de misericórdia:

— É meu caro, você está certo; o que não está certo é a sua condecoração…

Convencido que tinha sido vingado, voltou a ocupar seu lugar à Mesa Diretora.

Edberto Ticianeli

Jornalista e Produtor Cultural. Ex-secretário Estadual de Cultura. Editor dos sites História de Alagoas e Contexto Alagoas.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *