De Prego a Cotonete de Orelhão

Edberto Ticianeli

Ontem à tarde (8), em pleno feriado católico de Nossa Senhora da Conceição, fui a até a Praça Guedes de Miranda, na Ponta Grossa, tentar cortar o cabelo com o amigo Charles, único profissional da afamada “Barbearia Hala (sic) Jovem”.

Tive sorte e o encontrei por lá. Entre tesouradas e penteadas conversamos sobre o futuro da profissão após o surgimento das máquinas de cortes elétricas, que facilitou a vida dos profissionais mas tirou um pouco da arte do ofício.

Lembramos do antigo “Texaquinho”, no posto de esquina da Rua Santo Antônio com a Rua Paysandu, onde o Biu começou a sua caminhada, que passou pelo Salão em frente ao Cine Lux e o levou a ser um dos mais requisitados cabeleireiros de Maceió, oferecendo atualmente seus serviços no Empresarial Leonardo da Vinci, na Ponta Verde.

Na volta para casa, optei por passar pela Rua Santo Antônio e quando estava nas imediações do antigo Cine Lux, recordei-me de um episódio envolvendo outro famoso barbeiro daquela área, o Sabino, que tinha salão vizinho ao cinema.

Célebre por inventar histórias mirabolantes, também era conhecido por perder a paciência com os cabelos sujos da meninada, que sempre provocavam danos nas lâminas de sua máquina manual de corte. Era uma daquelas que depois de algum tempo de uso preferia “arrancar” o cabelo em vez de cortá-lo.

Quando o velho barbeiro encontrava vestígios de areia na cabeça de um pobre coitado, ficava vermelho, dava uns tapas na cabeça do freguês e fazia um breve discurso sobre a higiene corporal.

Um dos que mais sofreram com ele foi o magro e alto Gerson Prego, filho de “seu” Mário Calheiros, um antigo morador da Rua Cláudio Manoel, que transportava areia lavada de Satuba em seus caminhões com a ajuda dos filhos, alguns adotados.

Certo sábado, na esquina da Rua da Assembleia com a Rua Guaicurus, onde se reunia a famosa “Turma da Esquina”, Gerson chegou dizendo que ia cortar o cabelo, mas estava cansado de apanhar do Sabino e queria se vingar.

Foi até a quitanda de “seu” Pedro, conseguiu um pouco de grude numa jaca aberta, passou no cabelo e jogou um pouco de areia por cima.

É claro, evidente e axiomático, como dizia Sandoval Caju, que Gerson ganhou naquele momento uma expressiva e empolgada torcida disposta a lhe dar apoio na sua ação vingativa. Claro também estava que esse apoio seria a distância, do outro lado da rua, na porta da Venda do “seu” Cícero.

“Seu” Sabino, vim cortar o cabelo —, anunciou o Prego, indo sentar-se na cadeira do barbeiro.

Poucos segundos depois, ouvimos do outro lado da rua o crepitar das lâminas da máquina quebrando em contato com a areia.

Gerson, que já esperava o tapa ou coisa pior, agilmente pulou da cadeira em direção à rua e deixou Sabino falando mal dele, da sua genitora e de toda a cadeia genética que o havia colocado no mundo.

Voltamos para a Turma da Esquina e comemoramos alegremente o feito do goleiro reserva do time do Guaicurus Futebol Clube, agora também conhecido como o Vingador.

Não vou entrar em detalhes sobre as punições que o Gerson recebeu do “seu” Mário Calheiros, mas lembro que por meses seu cabelo ficou sem corte. Entre nós, seus amigos, deixou de ser o Prego para ser o Cotonete de Orelhão.

Edberto Ticianeli

Jornalista e Produtor Cultural. Ex-secretário Estadual de Cultura. Editor dos sites História de Alagoas e Contexto Alagoas.

Um comentário em “De Prego a Cotonete de Orelhão

  • 9 de dezembro de 2021 em 19:32
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    Meu querido Galeguinho do Kisuco, você hoje me proporcionou uma viagem no tempo com gostosas lembranças do Texaquinho, que tinha Biu e seu irmão Cabelinho, a venda do Sr. Cícero e uma especial, Sr. Mário Calheiros com sua casa que ficava, literalmente, de frente para Rua da Assembleia onde estacionava seu caminhão. Vou parar por aqui, mas, o tema vale um dia, ou até mais, de recordações.

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