Mondrongo   

Miguel Gustavo de Paiva Torres

Pensamento. Letras. Palavras, na terra onde nasci tem significados. Na terra dos outros ressignificados. Mondrongo nasceu na Galícia, onde o V é o B e o X é o G. A língua dos galegos fez do espanhol e do português uma sopa de Mondongo. Mondongo não é Mondrongo.

Mondongo é uma dobradinha. Tem tripas, bucho e alma dos animais que são abatidos e dos animais que comem os abatidos, levados ao fogo. Mondrongo significava, nas terras da Galícia, pântanos, várzeas, lamaçais. No Panamá virou uma dobradinha atomatada e na Colômbia uma sopa. Comida de macho, diziam. Conversa para boi dormir. O mondongo tem o sabor, o cheiro e a alma feminina.

Mas eu estava falando do mondrongo, que nada tem a ver com o mondongo, a não ser o corpo e o espírito da Galícia, suas velas acesas e suas bruxas voando na Bassoura. Em Portugal os bois voavam. Na Galícia as bruxas faziam os seus despachos com mondongo apimentado para espantar os mondrongos.

O mondrongo é um bicho disforme, parecido com os humanos: um monstrinho que assombra crianças e velhinhos porque homem que é homem e mulher que é mulher faziam de conta que não se assustavam com aparições de mondrongos. Eles são reais.

Na verdade, afirmam, são espíritos do mal que sempre estiveram encarnados no espírito dos tempos. Ou seja, ontem, hoje e amanhã, segundo a divisão clássica do sol e da lua, em noite e dia.

De vez em quando aparecem mondrongos especiais viajando na poeira do tempo. O maior de todos os mondrongos, caso houvesse uma pesquisa planetária, matematicamente objetiva, teria sido Adolf Hitler, superando todos os mondrongos da pedra lascada, da antiguidade e da era pré-industrial. É com a segunda guerra mundial que se produz uma variação genética nos mondrongos clássicos e aparece o super mondrongo. Míticos, indestrutíveis. Superando, inclusive, a capacidade de sobrevivência material dos tardígrados no vácuo moral e espiritual da nossa contemporânea era do antropoceno, pós-moderna, “dark” e virtual.

Trump é o rei dos mondrongos do antropoceno. Tem a assustadora aparência de mondrongo em carne e osso.  Adquiriu a plenitude da alma, pensamento, palavras e significado do mondrongo mítico. Além disso é um mondrongo replicante com sexo indefinido. Pariu e criou uma manada de mondronguinhos mundo afora: Putin, Bolsonaro, Erdogan, Bin Salman são os que saíram mais parecidos ao pai. O seu espermatozoide também fecundou óvulos na África, Caribe e Círculos Polares.

Vinga mais rapidamente nos trópicos de câncer e de capricórnio. Gosta de sol e de óculos escuros. Tem mondrongo com olhos azuis e, como o pai, cabelos castanhos alourados. Às vezes fazem sopa de mondongo com os seus próprios filhotes pretos, marrons e amarelados, sempre filhotes rejeitados. Odeiam mondrongas, aberração da natureza. Mondrongos não devem ter sexo definido. Só mentes e corações de mondrongo.

A arte da mentira e da enganação é e deverá sempre ser o seu único modo de reprodução. A violência, as armas e a tempestade de fogo, morte e destruição no hálito e no verbo, com a cruz e a bíblia.

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