A Mídia, o Holocausto e o escravo Stephen
Sérgio Braga Vilas Boas
A dita “grande mídia brasileira”, em destaque as três pecinhas do amor, Globo, Folha e o Estadão, consegue ser mais lacaia, pusilânime e vassala que a mídia dos chamados países centrais, leia-se Europa e EUA. Impossível não lembrar do personagem interpretado por Samuel L Jackson no filme “DJango Livre”, dirigido por Quentin Tarantino, o escravo Stephen. Stephen era uma espécie de “capitão do mato gourmet”, do personagem Calvin Candie, interpretado por Leonardo di Caprio. Calvin não sabia falar uma só palavra do francês mas gostava de ser chamado “Monsieur Candie”. Soava encanto. Stephen era a personificação da traição e do ódio a seu próprio povo. Uma criatura deplorável, abjeta. Sem dúvida mais abjeta que seu “senhor”, do alto da sua monstruosidade.
Fiz esse prólogo em função do farfalhar das penas das galinhas televisivas e suas caras de poodle com constipação, horrorizadas com a fala do Lula dizendo a verdade sobre o que ocorre em Gaza.
“Não, não pode comparar com o Holocausto! É um desvario, uma estupidez, um desrespeito etc !”
Não há qualquer dúvida sobre o que representou o Holocausto, sua monstruosidade. Não há qualquer dúvida que consta na galeria dos crimes hediondos cometidos pelos homens contra si mesmos, ocupando espaço de destaque. Ninguém jamais ousou discordar disso.
Mas então por que diabos Lula resolveu comparar a situação em Gaza ao massacre de judeus perpetrado pelos nazistas?
Segundo o professor João Diogo da Universidade de Howard, em Washington-DC, EUA, de cujas fileiras saiu Kamala Harris, atual vice-presidente dos EUA, português de nascimento, em artigo publicado no jornal português EXPRESSO, o colonialismo matou mais que o holocausto.
Não se trata de uma competição acerca de “quem matou mais” ou de “qual povo foi o mais massacrado”. Não, não se trata disso. Seria além de mórbido, patético, inapropriado, cruel e desrespeitoso fazer isso.
Mas, segundo o João Diogo, e há aceitação por parte dos historiadores acerca desses números, entre 1492 e as primeiras décadas de 1600, morreram cerca de 56 milhões de indígenas, por armas ou doenças levadas pelo colonizador europeu.
Continuando, entre os séculos XV e XIX morreram cerca de 18 milhões de escravos africanos. Segundo o professor, o genocídio dos povos Hererós e Namaquas praticados pelos alemães onde hoje é a Namíbia, entre 1904 e 1907, foi o laboratório dos métodos empregados para o massacre dos judeus mais adiante.
No “Estado Livre do Congo”, durante a partilha da África pelos europeus entre 1885 e 1908, cerca de 10 milhões de africanos foram massacrados.
Vale lembrar ainda dos milhares de pessoas que sucumbem a alguma outra guerra, ou à fome e doenças, herança mórbida de um sistema econômico que lhes nega o direito à vida.
Talvez se Lula tivesse comparado o genocídio dos palestinos ao sofrido pelos povos colonizados, não tivesse levantado tanta celeuma, as galinhas carpideiras não tivessem feito esvoaçar suas penas, e talvez não víssemos suas caras de poodle com constipação.
Vidas de judeus europeus são tão válidas quanto de palestinos, negros, índios, amarelos, ciganos, etc.
Talvez tenha sido por isso que o Lula comparou genocídio de palestinos ao genocídio de judeus europeus. Ambos são uma tragédia humanitária com qual não deve haver complacência, parcimônia, tolerância.