Aprendendo com a história

Edberto Ticianeli – jornalista

Se em 1927 o Exército Vermelho da URSS não tinha tanques, um terço dos recrutas não tinha uniformes e quando ocorriam os desfiles na Praça Vermelha os soldados marchavam ao lado de suas bicicletas, como esse mesmo Exército foi levado a cumprir papel decisivo na derrota do nazismo na primeira metade da década de 1940?

O livro “Stalin, paradoxos do poder”, de Stephen Kotkin, mesmo criticado por seu viés revisionista, fornece alguns dados importantes para se entender como funciona o pensamento estratégico tão abandonado hoje em dia.

Em janeiro de 1927, Kliment Voroshilov, um dos líderes do Partido Comunista, alertou durante uma conferência em Moscou (foi reproduzida pelo Pravda): “Não devemos esquecer que estamos à beira de uma guerra, e que esta guerra estará longe de ser divertida”.

Foi esse mesmo militar, Kliment Voroshilov, que numa plenária do Comitê Central de 12 de fevereiro de 1927 apresentou um plano para a preparação militar soviética para a guerra.

Stalin, dias depois reforçava os temores identificando como inimigo número um o capital financeiro inglês e seu governo.

Sabendo que o desenvolvimento econômico soviético provocaria um inevitável conflito com os estados capitalistas, dizia Stalin: “Não podemos ter ilusões sobre a possibilidade de estabelecer relações ‘boas’ e ‘amistosas’ com ‘todos’ os estados burgueses”.

E completou: “Em algum momento, surgirá um grave conflito com esses estados burgueses que são conhecidos por serem os mais hostis em relação a nós, e isso não pode ser evitado, seja por um tom moderado na imprensa ou pela ou pela experiência sagaz dos diplomatas”.

Nessa época, a Alemanha tentava se recuperar industrialmente após a derrota na Primeira Guerra Mundial e namorava a possibilidade de levar seus investimentos para solo soviético, principalmente a indústria militar.

Como os soviéticos aceitaram negociar com os germânicos, a Inglaterra tratou de aumentar as ações de fustigamento contra o jovem poder socialista.

Stalin acreditava mesmo que os britânicos tinham passado a desenvolver uma política de cerco à URSS a partir do Oriente (China, Afeganistão, Pérsia e Turquia) e pelo Ocidente, utilizando os países das fronteiras.

Com a ascensão de Hitler na Alemanha, o polo ameaçador contra a URSS se deslocou para aquele país, o que não alterava muito o esforço de guerra.

As correções na estratégia de preparação para o conflito aconteceram principalmente na política de alianças e no empenho em retardar o início das agressões, permitindo vencer a corrida contra o tempo e assim armar convenientemente o exército soviético.

Independente das possíveis críticas a Stalin, é incontestável que a URSS tinha dirigentes experientes e com elevado conhecimento militar e político para estabelecer uma estratégia capaz de deixar aquela federação em condições de enfrentar e vencer uma guerra.

O ensinamento que mais poderia servir para a atual realidade brasileira é: quem conhece a natureza do capital não se ilude com ela.

Edberto Ticianeli

Jornalista e Produtor Cultural. Ex-secretário Estadual de Cultura. Editor dos sites História de Alagoas e Contexto Alagoas.

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