O capitalismo e o escorpião

Edberto Ticianeli – jornalista

Engana-se redondamente quem acha que uma pandemia como esta do coronavírus vai fazer o capitalismo ser repensado.

Nas redes sociais tem surgido comentários indicando essa perspectiva.

Não enxergo essa possibilidade.

Há uma “natureza” capitalista que foi tomada emprestada do escorpião, aquele da lenda com o sapo.

É da sua essência conviver com a destruição.

O sistema de exploração sabe, de sobra, como tirar proveito do caos.

Por exemplo, quando uma enchente destrói cidades, o cidadão comum percebe a catástrofe com tristeza e lamenta.

O capital enxerga como uma nova área de investimentos para a construção civil.

É evidente que numa situação de crise, parte do capital muda de mãos e que segmentos produtivos importantes são destruídos.

Eles sabem disso.

Principalmente os que estão no topo da pirâmide, os intocáveis e principais aproveitadores de situações como estas.

No caso dos danos provocados pelo Covid-19, já começaram a mover os cordéis para reposicionar as políticas econômicas adotadas por seus governantes espalhados pelo mundo.

A primeira grande mudança foi o abandono do “Estado Mínimo”.

Para eles, é hora de mandar o liberalismo para casa e adotar o velho bom parceiro das crises: o Estado intervencionista.

Estado bom, que socorre todo mundo com o saudável dinheiro público. Antes o Estado era criticado por ser ineficiente e corrupto, lembram?

Os países são chamados a adotar medidas que até há poucos meses seriam identificadas como próprias das “ditaduras comunistas”.

Assim agem os países do G20, as principais economias do mundo.

Mas nem todos entenderam o recado dos donos do dinheiro. No Brasil, o governo está demorando a assimilar essa reorientação.

Por aqui, o grande capital deverá ser mais explícito diante da limitada capacidade de entendimento dos condutores da economia.

Mas tem um fato novo assustando o velho capital, que já passou por várias guerras e sobreviveu, mesmo diante da perda de milhões de vidas humanas.

A China, que já vinha expandindo seus negócios pelo mundo de forma acelerada, está de olho no pós-pandemia e preparada para investir onde for necessário.

O capitalismo não será repensado enquanto sistema de exploração, mas terá que reaprender a conviver, no mínimo, com um mundo bipolar.

Significa que o capital terá dificuldades para exercer sua natureza predatória. Mas não espere que mude sua essência: continuará a ser um escorpião.

Edberto Ticianeli

Jornalista e Produtor Cultural. Ex-secretário Estadual de Cultura. Editor dos sites História de Alagoas e Contexto Alagoas.

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