Maledita e o Satanás

Edberto Ticianeli – jornalista

Não estranhe o nome: é Maledita mesmo, irmã gêmea de Benedita. São filhas do pastor neopentecostal Enoque Barriquelo, que se vingou em uma das filhas o que o pai fez com ele por nascer com nove meses e meio.

Explicada a origem do seu nome, vamos a história da Maledita, motivo para estarmos aqui olhando para a tela.

Liderança religiosa da comunidade de Capão Quadrado, uma favela situada ao lado de Capão Redondo em São Paulo, Maledita estava na sala de espera do Palácio do Planalto para uma audiência com o presidente da República.

Pretendia requisitar os préstimos presidenciais para a compra de duas “cornetas” de som, condição necessária para o funcionamento do templo que pretendia inaugurar na salinha do sobrado de Tião Ferreiro (garantia de barulho o ano inteiro).

Não sabia a neopastora, que já estava na sala com o indômito Bolsonaro uma colega sua que garantia falar com Deus desde os seis anos e que estava apresentando um remédio milagroso à base de enxofre, combatente eficaz contra o coronavírus.

Maledita entrou na mesma sala minutos após a curandeira deixar o ambiente. Saiu correndo de lá segundos depois de ter entrado.

Com o rosto exibindo pavor, gritava para todo mundo ouvir que o demônio estava naquela sala.

Os funcionários chamaram logo um general que passava a maior parte do tempo cochilando numa sala vizinha.

General Listrinha, era assim conhecido por ter chegado um dia ao Palácio de pijama, se aproximou da religiosa e calmamente perguntou-lhe o nome.

— Eu sou Maledita, senhor! — respondeu a religiosa.

— Não diga isso! A senhora é bendita — argumentou Listrinha.

— Eu sou Maledita mesmo. Benedita é minha irmã — explicou a mulher.

Listrinha não entendeu nada e passou para a fase seguinte do interrogatório, digo, da conversa:

— Por que a senhora acha que o demônio está na sala do presidente?

— Assim que entrei, senti o cheiro do enxofre e fui logo olhando a testa dele para ver se tinha chifres. Não deu para ver, mas o olhar dele era de uma pessoa alucinada, possuída pelo demônio, tenho certeza disso — explicou Maledita.

Quem respondeu a ela foi o próprio presidente, que tinha aberto a porta da sala e acompanhado a última declaração da mulher.

Demônio é a putaquepariu! E chifre você vai encontrar na cabeça do seu pai, sua vagabunda, comunista

Maledita não ouviu o resto. Desmaiou diante do que acreditava ser o Satanás em pessoa.

Com a porta aberta, o cheiro de enxofre se espalhou pelo salão e Biu Chaleira, garçom do presidente, jura que nessa hora viu Listrinha fazer o sinal da cruz por três vezes.

Edberto Ticianeli

Jornalista e Produtor Cultural. Ex-secretário Estadual de Cultura. Editor dos sites História de Alagoas e Contexto Alagoas.

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