Roberto Beckér e a fake news da baleia

Edberto Ticianeli – jornalista

Conversava esta semana com meu amigo e barbeiro Charles sobre política e ele criticava as informações mentirosas que recebia via celular, as tão comentadas fake news.

Lá pras tantas, quando dava os últimos cortes nos poucos cabelos que me restam, disse uma coisa que me fez reunir em assembleia geral tico & teco: “Só tem gente mentindo, porque tem quem acredite nas mentiras”.

Pura verdade! Digna dos mais renomados filósofos do Baixo Pirulito, terras do Alentrilho. Bairro da Ponta Grossa, como é mais conhecido.

Essa afirmação me fez lembrar de duas histórias que comprovam plenamente o enunciado charleano.

A primeira delas, e a mais conhecida, envolve o popular Jocão, que durante décadas foi considerado o mentiroso oficial do Café Central, no comércio de Maceió.

Certo dia lhe pediram para contar uma mentira. Fez cara de sério e largou:

— Amigos, lamento não poder atendê-los. O momento é de profunda tristeza, pois estou chegando do hospital onde minha mãe acabou de falecer.

Como era de esperar, todos fizeram cara de triste e apresentaram condolências ao mais novo órfão de Maceió, além de se prontificarem a ajudar nos custos do enterro, o que foi imediatamente aceito pelo Jocão, que fez a coleta com todos os amigos que estavam no Café do Cupertino.

Despediu-se avisando que o enterro sairia da sua casa na tarde do dia seguinte. Morava perto da Praça do Pirulito.

Passava um pouco das três horas da tarde quando os amigos chegaram à casa do Jocão. E lá estava ele, na porta, sentado numa cadeira de balanço a fumar tranquilamente.

Jocão, cadê o enterro? Não estou vendo caixão algum! — protestou um deles.

— Enterro??? Que enterro?

— O da sua mãe. Você não disse ontem que ela tinha morrido?

— Ah!!! Lembrei agora! Mas eu falei porque vocês pediram pra contar uma mentira.

A baleia encalhada

A outra mentira foi contada pelo inesquecível Roberto Beckér, que nasceu Domingos Annunziato Litrento, mas quando começou a fazer sucesso como cantor e compositor, nos anos 50, adotou nome artístico.

Perdeu uma eleição de vereador por causa dessa alteração. Fez toda a campanha pedindo votos para Beckér, mas tinha sido registrado como Domingos. Seus votos foram nulos.

Roberto Beckér

Conhecido e reconhecido como presepeiro, Beckér chegou na porta do Cine São Luiz num sábado à tarde e encontrou uma multidão tentando entrar no cinema.

Como não estava disposto a enfrentar a imensa fila e sabendo que se tentasse furá-la seria criticado, o que não pegava bem para um artista, teve a brilhante ideia de criar o que seria uma fake news da época.

Gritou para uns amigos que não ia assistir ao filme e que ia para a Av. da Paz ver a baleia que tinha encalhado na praia há poucos minutos.

Não demorou e uma verdadeira multidão abandonou a porta do cinema em direção à Praia da Avenida, a quinhentos metros do local.

Beckér fazia que ia, mas não ia e foi ficando. Ficou e percebeu que com ele permaneceram poucos.

Como todo artista, gostava do cinema lotado, plateia perfeita para suas famosas tiradas, que provocavam risadas nos espectadores e a ira do gerente.

Demorou-se um pouco na porta do São Luiz e depois começou a caminhar em direção à praia. Alguém da fila gritou pra ele:

Beckér, vai perder o filme?

— Esse filme nem é tão bom. Prefiro ir ver essa baleia que disseram que encalhou na praia. Tá todo mundo por lá —, respondeu e foi embora.

Fake News poderosa é uma dessa…

Edberto Ticianeli

Jornalista e Produtor Cultural. Ex-secretário Estadual de Cultura. Editor dos sites História de Alagoas e Contexto Alagoas.

2 comentários em “Roberto Beckér e a fake news da baleia

  • 23 de fevereiro de 2021 em 15:08
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    Muito bom. Ri muito agora. Parabéns pelo site, Ticianeli. Roberto Beckér foi um grande artista. Único na sua forma de conduzir e aglutinar várias habilidades artísticas: cantar, contar histórias, contar piadas, imitar personalidades, improvisar rimas, dentre outras. Um show-man de fato e um homem de uma alegria contagiante.

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  • 24 de fevereiro de 2021 em 13:55
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    Edberto, sou alagoana , nasci na Pajuçara , na rua do Cine Rex. Vivi até os treze anos nessa rua do Cravo e mudamos depois pra rua do Comércio, na ultima quadra da rua , já próximo da Praça dos Martírios. Em seguida, minha família mudou para o Rio de Janeiro e fui junto com eles, após falecimento do meu pai. Foi difícil viver longe desta terra querida, mas tinha de ser e fui me adaptando.
    Hoje, estou de volta á Maceió, com toda família e me deliciando com as suas estórias do quotidiano da minha época, quando vivia por aqui.
    As fotos publicadas acima , me remetem a um passado distante e ao mesmo tempo tão próximo, que nunca me saíram da cabeça. Meu pai tinha parada obrigatória no Bar Colombo, era amigo dos portugueses , donos do bar, e nós crianças iamos ate lá, beber Guaraná Caçula.
    Leio seus artigos através da minha amiga e contemporânea , Luitgarde Cavalcante Barros.
    Relembramos os nossos anos de Instituto de Educação e os nossos passeios no Comércio.
    Obrigada Ticianeli, por manter viva em nossa memória, esta terra do Brasil que tanto amamos.

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