Lula e o PT: o novo tempo

Sérgio Braga Vilas Boas

Lula envelheceu. Passou maus bocados junto com a família. Viveu um drama pessoal e político. E esse drama lhe trouxe danos à saúde e à imagem, que talvez nunca recupere totalmente.

Voluntarista é coisa que nunca foi, e muito menos agora, depois de tudo que passou e viu acontecer diante de si, e, de certa forma, mantendo o equilíbrio. Foi uma dura luta pela sobrevivência pessoal e política. Sua resiliência é algo impressionante. Algo que faz muita gente roer os dedos de inveja e tomar Rivotril de tanta raiva.

Erros foram cometidos nos primeiros tempos. Principalmente estratégicos. Talvez — para mim com certeza — por uma interpretação débil da realidade objetiva, principalmente das complexas relações internacionais, com o Brasil passando a representar “perigo” perante as potências do mundo, principalmente da potência hegemonista ocidental.

Internamente, fornecemos alimento para a alta burocracia estatal espatifar-se em tribos predatórias e ameaçadoras, que passaram a se considerar como um poder paralelo, a ponto de entabular negociações com o Departamento de Justiça dos EUA, sem aval do estado brasileiro, enquanto um Ministro da Justiça anódino bafejava republicanos cinderela.

Já a dita elite tupiniquim, essa, em geral, salvo raríssimas e honrosas exceções, é sabuja por natureza. A pusilanimidade é sua companheira inseparável, além de se mover pelo ódio de classe e o desprezo pelo Brasil.

Sob o ponto de vista econômico, adotamos o programa do adversário derrotado em 2014, e levamos a culpa pela debacle a que isso nos levou.

Pois bem, Lula sabe mais do que ninguém de tudo isso. Esse filme deve passar por sua cabeça cotidianamente, várias vezes. Sabe, a despeito de ter sofrido prejuízos à imagem, que tem um poder aglutinador sem concorrente, hoje, por estas bandas. Sabe que sua inserção internacional talvez seja a maior, entre todos os políticos brasileiros em nossa história.

Mas, também sabe que isso por si só não é suficiente. Enquanto Obama lhe dava tapinhas nas costas e dizia “esse é o cara!”, o “Deep State” americano tramava sua eliminação política e a subjugação do Brasil.

Sabe que a elite brasileira quando o recebia em “sua casa”, estendia tapete vermelho e depois mandava desinfetar os talhares com álcool 70, já que usar descartáveis não seria de bom tom.

Em seu calvário, sabemos hoje pelas conversas “hackeadas”, que os procuradores da Lava Jato o tratavam como um pinguço atrevido, que deveria estar cavando valetas em alguma obra da prefeitura de Garanhuns, com D. Marisa lhe levando marmita numa vasilha de Tuperware enrolada num pano, ao meio dia.

Enfim, o novo tempo, se houver, não será fácil. Todavia com uma vantagem: a experiência vivida.

A guerra que se trava sem tiros nem bombas, que garantirá no futuro a continuidade da já debilitada hegemonia americana ou um mundo multipolar, exigirá do Brasil tomada de posições que o retirem da insignificância que abraçou, da condição de pária à qual se entregou.

O Brasil se encontra com a economia destroçada; com um mercado de trabalho que não consegue incluir nem metade da sua mão-de-obra economicamente ativa; com a indústria decapitada; com a volta da fome; com insegurança social e outros males consequentes.

Apenas um palpite, é claro. Eu não sou o Lula. Se eu fosse ele, teria feito como o Rafael Correa, que se mandou pra Bélgica antes de ser preso. O palpite é que de fato não se sabe se Lula será candidato ou não em 2022, a despeito da euforia da militância e de seus pares dentro do PT e outros partidos aliados.

Lula, aí vai outro palpite, também ainda não sabe se será candidato. Não se trata do PT ter candidato. Se trata do Lula ser esse candidato. Só não será candidato se não tiver pelo menos uma certeza, além dos números favoráveis das pesquisas de opinião: que poderá governar por pelo menos quatro anos dentro de um programa mínimo de recuperação do Brasil enquanto nação e enquanto participante ativo e independente nas articulações internacionais.

Eis porque se movimenta. Seus movimentos não são apenas para garantir apoio em eventual disputa eleitoral, mas para falar sobre o que vamos fazer com a “merda” em que nos transformaram. Aqui, internamente, e com prováveis aliados internacionais como a Rússia e a China, por exemplo. Não só o Brasil depende disso, mas a América Latina, pelo nosso tamanho e importância. Não disputará eleições para ganhar e depois sair de pires na mão. Isso qualquer um pode fazer, não ele.

Isso pode parecer óbvio, mas não é. Quem disputa eleições para ganhar, vai governar, certo? Não há tanta certeza assim. E Lula não emergiu de um afogamento dado como certo para sufocar no passo seguinte.

São apenas palpites.

Edberto Ticianeli

Jornalista e Produtor Cultural. Ex-secretário Estadual de Cultura. Editor dos sites História de Alagoas e Contexto Alagoas.

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