O vendedor de vacinas
Edberto Ticianeli
Agamito Sabaduelli entrou em casa e em quanto se desfazia da farda foi anunciando pra mulher:
— Estou cansado dessa vida de cabo da Polícia Militar e a partir de amanhã nossa vida vai mudar.
Surpresa com o anúncio, Lisa Senchek cobrou explicações com aquele olhar que somente as mulheres sabem fazer.
— Vou ser vendedor de vacinas em Brasília. Um bom negócio com essa pandemia —, explicou o militar
— Mas você vai vender pra quem, hômi?
— Para o Ministério da Saúde, claro.
— E quem diabos vai querer comprar vacina de um cabo da Polícia do Estado de Minas do Sul? Conhece alguém em Brasília? Além disso, você não pode se afastar do Quartel para viajar por aí vendendo remédio.
— Eu dou um jeito. As comissões são boas. É vender e receber.
E assim o Cabo Sabaduelli passou a viajar semanalmente para a capital federal na árdua tarefa de convencer às autoridades a adquirirem a vacina que dizia representar no Brasil.
Um ano e oito meses depois, D. Lisa perdeu a paciência.
— E então? Ainda não vi a cor desse dinheiro. Você vendeu alguma vacina?
— Ainda não, mas assim que vender vou pegar uma grana verde e amarela de “responsa”!
Foi aí que o caldo entornou.
— Você pensa que eu sou alguma idiota? Você acha que eu acreditei nessa história que você ia vender vacina? Você nunca vendeu nada na vida, é cabo de Polícia há 20 anos, não conhece ninguém em Brasília, tem quase dois anos que viaja e não vendeu nada.
— Mas eu votei no presidente e espero que ele me ajude — tentou explicar o mercador de ampolas.
— Não tente me enganar! Eu sei que você tem uma rapariga em Brasília e inventou essa conversa fiada, sem pé nem cabeça, para justificar suas viagens para lá.
— Mas é verdade que sou vendedor. Ontem mesmo fui interrogado numa investigação dos deputados sobre essas vendas e contei a eles essa mesma história.
— Pois você arrume suas coisas e suma da minha frente. Não acredito numa palavra do que você disse. Os deputados podem até acreditar, mas eu não sou besta para não perceber que você está mentindo.
Parou de falar por alguns segundos, olhou para Sabaduelli e notou que ele estava sem o celular.
— Tá vendo! Escondeu até o celular para que eu não veja as mensagens que você mandou pra sua amante.
— Não foi isso não! É que os deputados tomaram meu celular.
Mal acabou de dizer isso e uma cadeira passou voando sobre sua cabeça.
— Seu desgraçado! Continua a mentir! Deputado nenhum vai tomar seu celular por você dizer que vende vacina.
Cabo Sabaduelli ajuntou algumas roupas e foi saindo de fininho. Já na porta da rua ouviu o último comentário da mulher:
— Onde eu estava com a cabeça ao casar com um sujeito que além de não ser capaz de vender vacina, não trouxe nem uma amostra grátis pra casa. Nem uma Covaxin ele arranjou.