“Barrabás” acaba com churrasco na Pitanguinha

Edberto Ticianeli

Entregador do Mercadinho Padre Cícero, no bairro do Feitosa, Nazário decidiu se estabelecer o mais próximo possível do seu local de trabalho para não gastar com passagens de ônibus.

Foi assim que ele e Efigênia deixaram a Grota da Caveira e passaram a ocupar uma pequena casa na Pitanguinha. Um luxo. Bastava subir a Ladeira da Moenda e já estava no trabalho.

Se já estava satisfeito com a nova morada, ficou mais ainda no final da tarde da sexta-feira, 1º de outubro de 2021. Dona Gertrudes, sua patroa, sabendo que Nazário aniversariava no dia seguinte, lhe dispensou do trabalho e ainda lhe deu como presente um pacote congelado com 650 gramas de carne bovina.

Era um coxão duro, mas era carne, algo ausente ultimamente das panelas de Efigênia.

Alegre, feliz e satisfeito, Nazário voltou para casa tomando todos os cuidados do mundo para não ser assaltado. Transportar valores é sempre um risco.

Em casa, conversou com a mulher e acertaram que no dia seguinte comemorariam seu aniversário em grande estilo: ofereceriam um churrasco, mas convidariam somente Ataulfo e sua esposa Dorotéia.

Os preparativos começaram ainda naquela noite. Efigênia levou a “manta” de coxão duro para o balcão da pia e aplicou-lhe uma sessão de espancamento até que ela confessou que na verdade era um contrafilé.

E assim temperado, foi para a geladeira esperar ser sacrificado no dia seguinte.

Às 11 da manhã, Nazário já tinha improvisado uma churrasqueira na calçada da casa enquanto esperava o casal convidado. Para amplificar sua alegria, instalou duas caixas de som na janela.

Aquela festinha também serviria como um cartão de apresentação para a vizinhança. Modestamente pensou: “Corro o risco de ser tratado como um exibicionista, afinal, churrasco, som alto, cerveja… luxo para poucos”.

Efigênia, como sempre cuidadosa, antecipou tudo e arrumou uma mesinha na calçada para colocar os pratos, talheres e num antigo recipiente de sorvete depositou a carne já devidamente fatiada no tamanho adequando para ser levada ao braseiro, nobremente instalado numa jante de fusca 67.

Quando as caixas de som começaram a cantar a “Saga de um Vaqueiro” com o acompanhamento da banda Mastruz com Leite, toda a vizinhança saiu à rua para ver o que estava acontecendo.

E lá estavam Nazário, Efigênia, Ataulfo e Dorotéia, devidamente sentados em tamboretes, tomando cerveja com amendoim torrado e aguardando o momento adequado para conduzir o “filé” para a fogueira.

Entretanto, o que chamou mesmo a atenção dos vizinhos foi a presença de “Barrabás”, um gato conhecido na redondeza por sua habilidade em fazer desaparecer qualquer comida que ficasse sem vigilância.

Com esse amigo do alheio ali, a atenção da plateia foi desviada dos decibéis para advinhar quando “Barrabás” agiria. Verdadeira bolsa de apostas logo foi formada.

Quando os “Cavaleiros do Forró” davam os primeiros acordes para “Minha Rainha”, o gato iniciou a sua participação na festa. Pelo canto da parede, subiu na mesinha e dois segundos depois desceu com o primeiro pedaço de carne. Subiu mais três vezes e levou o resto.

Nazário via a expressão de alegria nos vizinhos e avaliava que era por causa do repertório musical. Foi então que resolveu fazer eles também sentirem o cheiro de carne assada. Seria o triunfo completo do novo morador.

Efigênia, bota a carne na brasa! — ordenou.

A mulher se levantou, foi até a mesinha e vendo Barrabás ao lado mastigando o último naco de carne, gritou:

— O gato comeu a carne!!!

O felino, alarmado pelo grito e utilizando sua vasta experiência no ramo, resolveu bater em retirada.

Nazário, de pé com as mãos na cintura, demonstrava que tinha acabado de entrar em depressão. Entrou em casa, desligou o som e não saiu mais.

Do outro lado da rua, Gerônimo Peixoto Júnior — que já estava gostando do repertório —, vendo a tristeza do vizinho, arrependeu-se de não ter avisado da presença deletéria do gato e tentou ajudar:

Mata o gato e faz churrasco com ele!

Não foi bem entendido na sua boa intenção e teve ouvir alguns “agradecimentos” em que seus familiares eram citados efusivamente.

No telhado, Barrabás também olhava para ele com cara feia.

Edberto Ticianeli

Jornalista e Produtor Cultural. Ex-secretário Estadual de Cultura. Editor dos sites História de Alagoas e Contexto Alagoas.

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