Tristeza
Miguel Gustavo de Paiva Torres
LOS VILLOS, CHILE, 1987.
Tristeza, por favor vá embora, é a minha alma que chora, no piano, Oscar Peterson; na janela, lá fora os barcos, coloridos, gaivotas, mar bravio, pedras, espuma-branca como a nota derramando lágrimas de sal.
Los Villos, costa chilena, no azul mais escuro e profundo do pacífico oceano de nossas almas. Dois amigos, Pato e eu, trancados em uma cabana com uma missão de fim de semana. Ouvir toda a discografia do pianista de jazz canadense Oscar Peterson.
Combustível para a navegação. Aguardente de cabeça das Alagoas e Pisco do norte chileno. Nota por nota, tudo sendo anotado em um caderninho para posteriores comentários.
A miragem das viagens musicais, incompreensível como o gozo e o êxtase do amor que cria e procria. Abelhas e colibris sugando e fecundando a vida na terra. O mistério do mar. Peixes voadores. Gaivotas na areia. Sol. Sol y Mar.
Longe, depois do deserto, ficou a cidade, ensanguentada, dividida, poluída pelo ódio da tirania dos generais de fancaria do Sul das Américas.
Aqui é o amor que é imperador. Imperador da beleza divina nessas notas musicais, brancas e suaves, dedilhadas pelo negro Oscar, mágico como o Orfeu em cada namorado, em cada apaixonado por todas as Eurídice que já nasceram, morreram e renascerão no vão da imaginação, de quem ama; de quem prefere a morte pela paixão, na música eterna, viajando no sopro suave da brisa do encanto e no furacão dos ventos do desejo.