As leis da física na democracia

Miguel Gustavo de Paiva Torres

Tudo é relativo. Relativo à posição do objeto, luz, ponto de observação, imaginação e crença. Nada é absoluto e muito menos verdade. São puras construções da mente humana para organizar e facilitar a vida em comum dos iguais. Por isso que, na Itália, “La legge e uguale per tutti”. Leia-se: “A lei é igual para todos os comuns”. Os diferenciados estão acima da lei, assim pensaram, ao que parece, aqueles que inventaram tábuas e códigos de procedimentos, delitos e penas.

Não foi fácil achar um modo razoável de organizar e regular grupos humanos nos assentamentos, cidades, estados e nações.

Queimaram muita massa cinzenta para inventar uma maneira de colocar ordem e convivência pacífica. Pensar local e agir global foi um achado importante para chegarmos ao ponto em que chegamos.

A forma mais humanizada que se encontrou nos últimos dez mil anos da história antropológica e social foi a da organização “democrática” — poder popular —, teoricamente inclusiva e iluminada pela ideia de República. Assim nasceram as constituições democráticas dos estados, sob o império da lei, observadas as singularidades de cada povo e de cada estado.

O importante era frear a barbárie, os motins e massacres com o emprego legítimo e autorizado, por um grupo eleito por todos, da violência para o bem comum. O como fazer para acreditarem e obedecerem, seguiu a lógica da e da crença na lei e naqueles que fazem, aplicam e são guardiões dela.

A democracia sempre foi relativa. Não há novidade nessa percepção desse sistema de governo universal. Universal porque todos, é claro, se dizem democráticos, ao seu modo próprio de entender essa abstração. Atenas e Roma excluíram escravos, mulheres e pobres desse jogo. A França derrubou o direito divino e hereditário das famílias reais e proclamou a Coisa Pública. A República. Algo que tirou do poder um grupo que fazia e implementava leis em nome do Rei e colocou outro grupo que passou a legislar para financistas e comerciantes, com o apoio das armas de Napoleão e suas tropas.

Foi o início das democracias modernas. A experiência da monarquia parlamentar na Inglaterra, no século anterior, foi apenas um ensaio de contenção de danos em uma ilha perdida no Atlântico Norte.

Por falar em ilhas, tome-se o exemplo de Cuba. Para o sistema de governo e organização social da ilha foi instituída uma “democracia real”: pão, casa, trabalho, saúde e educação para todos. Pensamento único e obrigatório no devido processo legal e penal. São as leis da física em ação local. Gravidade e relatividade. A palavra democracia está mais assemelhada à organização platônica da República em Atenas e, posteriormente, em Roma.

A lei não é igual para todos, como escrito nas paredes dos fóruns e tribunais nos últimos dois mil e quinhentos anos. Não é igual para todos em todos os lugares, urbi et orbi, como bem sabe o Papa católico, Francisco, no Vaticano, e os demais chefes cristãos ortodoxos e protestantes. Por esses motivos de ordem, organização e paz muitos hierarcas religiosos apoiaram a força e a violência do Estado contra insurgentes ao longo da história, sangrenta, dos humanos nos três mil últimos milênios.

Tudo é relativo. É verdade. Mas não é justo.

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