Pinochet: tiros e bombas em Santiago
Miguel Gustavo de Paiva Torres
Não satisfeito em se apropriar dos caríssimos charutos cubanos do embaixador Jorge Ribeiro, em recepção na Residência da embaixada do Brasil no Chile, o deputado federal do PMDB de São Paulo, João Cunha, foi alvo do interesse da imprensa por haver declarado que tinha ido a Santiago para tirar o general Augusto Pinochet do Palácio de La Moneda.
Os jornalistas brasileiros que cobriam a delegação liderada pelo também deputado federal Fernando Gasparian (PMDB) — normalmente sediados em Buenos Aires — repercutiram internacionalmente a declaração do bigodudo deputado brasileiro.
No dia seguinte ao jantar com charutos cubanos, teve início a I Assembleia Parlamentar Internacional pela Democracia do Chile, programada para acontecer entre 20 e 21 maio de 1986 no Hotel Tupahue, que se localizava numa estreita e tortuosa rua do centro daquela cidade.
Fomos todos para lá, os parlamentares e eu, chefe do setor político da embaixada brasileira e designado para acompanhar os 12 deputados e um senador do Brasil. No local estavam 65 parlamentares de 14 nações latino-americanas
Mais ou menos uma hora depois de iniciado a assembleia, faltou energia elétrica no hotel. Logo em seguida ouviram-se tiros e bombas no lado de fora.
De repente, um grupo de agentes armados da inteligência chilena invadiu o prédio para “proteger” os políticos chilenos e latino-americanos. Anunciavam que haviam recebido informações da existência de uma bomba prestes a explodir no local.
Todos ficaram apavorados, inclusive eu, claro. Fernando Gasparian, líder da delegação brasileira, pediu-me para que telefonasse ao embaixador e relatasse o que estava ocorrendo.
Não lembro como consegui telefonar (ainda não existiam celulares), mas consegui.
Gasparian falou com o embaixador Jorge Ribeiro, que prometeu ir buscar a delegação pessoalmente.
Já era quase noite quando o embaixador conseguiu chegar ao hotel. Fomos todos andando em pacífica fila indiana, com o embaixador à frente, para a Residência da embaixada, também na região central, sem energia elétrica em toda a região central.
Lívidos de medo, muitos parlamentares queriam regressar imediatamente ao Brasil. Naquela mesma noite o Fórum foi declarado concluído e desativado, juntamente com a suposta bomba.
Fernando Gasparian embarcou, no dia seguinte, de volta a Brasília, com o grupo parlamentar brasileiro. Jorge Ribeiro, o embaixador, saudado como herói, ganhou a capa da Veja.