Renan Calheiros e o poder moderador do Senado

Edberto Ticianeli – jornalista
Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

O recente processo da escolha da Mesa Diretora do Senado revelou o preocupante distanciamento daquela casa de sua missão maior.

Mas qual seria essa missão?

A grosso modo pode-se atribuir ao Senado a tarefa de ser o poder moderador da República, a casa revisora, onde são corrigidos os desvios e contidos os excessos.

A Constituição de 1934, uma das mais completas cartas elaboradas no país, estabeleceu que o Senado faria a coordenação dos poderes federais, o que lhe permitia cumprir também o papel de garantidor da continuidade administrativa, possibilitando a execução dos projetos governamentais planejados para acontecerem em um período de tempo mais longo.

Essa característica moderadora do Senado fica mais expressa nas Monarquias parlamentares. No caso das Repúblicas parlamentares, esse poder também é chamado a coordenar a atividade política.

No Brasil, uma República federativa, o Senado atua também como a casa dos representantes das unidades federadas, “moderando” a relação das unidades territoriais com os poderes.

“A verdade é que o Senado não deve ser apenas a ‘Embaixada dos Estados-membros’, no sistema federativo, mas também, e principalmente, a inabalável e indestrutível muralha de equilíbrio, compreensão e solidariedade, na qual devem quebrar-se os vagalhões de excesso, incompreensão e egoísmo, que, por vezes, se ergueu no oceano político revolto da Câmara dos Deputados”, define o professor Paulino Jacques em seu estudo “O Senado como Poder Moderador”.

Desconfio que o nosso Senado está cada vez mais longe de cumprir este papel.

Na eleição concluída no sábado (02/02), ficou evidente que Renan Calheiros, um dos postulantes à presidência da Mesa Diretora, fez inúmeros acenos para os partidos da base do governo Bolsonaro, se colocando como um líder político que poderia cumprir a missão moderadora.

O senador alagoano chegou ao ponto de ressaltar suas novas características liberalizantes indicando que não seria obstáculo para as reformas que terão que tramitar pelo Senado.

Não foi entendido e desistiu. Saiu da disputa alegando que a exibição do voto comprometia a liberdade de escolha dos parlamentares.

Sem Renan, a maioria escolheu o candidato dos Bolsonaros.

Pode ter sido uma vitória momentânea.

Os governistas passaram a ter o controle da Mesa, mas será que garantem a aprovação dos seus projetos?

Parte expressiva dos senadores continua como se estivesse em campanha e sequiosa de poder, não percebendo que os processos legislativos são complexos, principalmente quando ocorrem no Senado, onde deve predominar o sentido moderador.

Independente dos próximos movimentos políticos, já se pode afirmar que o Senado dificilmente atuará para corrigir os desvios e conter os excessos.

Edberto Ticianeli

Jornalista e Produtor Cultural. Ex-secretário Estadual de Cultura. Editor dos sites História de Alagoas e Contexto Alagoas.

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