“No Caminho com Maiakóvski” não é uma poesia de Maiakóvski
Sempre reproduzida nos materiais de propaganda utilizados pelos que lutaram contra a Ditadura no final dos anos 70 e início dos 80, uma famosa poesia era atribuída a Maiakóvski.
Raros são os que não a conhecem:
“Na primeira noite eles se aproximam
e roubam uma flor do nosso jardim
E não dizemos nada.
Na segunda noite, já não se escondem;
pisam as flores,
matam nosso cão,
e não dizemos nada.
Até que um dia,
o mais frágil deles
entra sozinho em nossa casa,
rouba-nos a luz, e,
conhecendo nosso medo,
arranca-nos a voz da garganta.
E já não podemos dizer nada“.
Para espanto de muitos, — inclusive eu, que somente descobri isso em 2007 —, “No Caminho com Maiakóvski” é do poeta fluminense Eduardo Alves da Costa, que esclareceu tudo em entrevista à Folha de São Paulo, edição de 20 de setembro de 2003.
Para aumentar a polêmica sobre a origem do poema, é justo lembrar que no documentário “Olhos Azuis“, de 1995, a professora e socióloga norte-americana Jane Elliott comenta que no final da Segunda Guerra Mundial, quando limpavam os campos de concentração na Alemanha, um ministro luterano disse:
Quando se voltaram contra os judeus,
eu não era judeu e não fiz nada.
Quando se voltaram contra os homossexuais,
eu não era homossexual e não fiz nada.
Voltaram-se contra os ciganos,
eu não era cigano e não fiz nada.
E quando se voltaram contra mim,
não havia ninguém para me defender.”
Pensem sobre isso.”
Leia agora a entrevista.
Um Maiakóvski no caminho
Foi resolvida graças à novela das oito uma confusão de 30 anos. Escrito nos anos 60 pelo poeta fluminense Eduardo Alves da Costa, 67, o poema “No Caminho, com Maiakóvski” era (quase) sempre creditado ao russo Vladimir Maiakóvski (1893-1930). Em “Mulheres Apaixonadas“, Helena (Christiane Torloni) leu um trecho do poema, dando o crédito correto.
Foi o suficiente para reavivar a polêmica — resolvida dois capítulos depois, em que a autoria de Costa foi reafirmada — e, de quebra, fazer surgir uma proposta de reeditar o poema, para aproveitar a exposição no horário nobre.
Livro combinado, a noite de autógrafos será na novela. “Pedi que apresse e me mande até o dia 10. Quero lançar aqui”, diz Manoel Carlos, autor de “Mulheres”.
Eduardo Alves da Costa falou à coluna:
NO CAMINHO COM MAIAKÓVSKI
E já não podemos dizer nada.
Nos dias que correm
a ninguém é dado
repousar a cabeça
alheia ao terror.
Os humildes baixam a cerviz;
e nós, que não temos pacto algum
com os senhores do mundo,
por temor nos calamos.
No silêncio de meu quarto
a ousadia me afogueia as faces
e eu fantasio um levante;
mas amanhã,
diante do juiz,
talvez meus lábios
calem a verdade
como um foco de germes
capaz de me destruir.