Getúlio Vargas era agnóstico
Edberto Ticianeli – jornalista
É verdade. Um dos mais importantes presidentes do país, além de se declarar um devotado seguidor do positivismo de Auguste Comte, também deixou registrado as suas insatisfações com o cristianismo.
Para quem duvida, recomendo ler os três robustos volumes da obra biográfica Getúlio, de Lira Neto. Lançada em 2012 pela Companhia das Letras, a coleção já está na 9ª reimpressão.
Em 4 de março de 1911, ao se casar com Darcy Sarmanho, então com 15 anos, Getúlio Vargas escolheu assumir os compromissos matrimoniais no Cartório, fugindo do casamento religioso.
O autor da biografia revela que Getúlio tinha como livro de cabeceira o explosivo, para a época, Jesus Cristo nunca existiu, do italiano Emilio Bossi.
No seu discurso de formatura na Faculdade de Direito, também deixou registradas suas opiniões sobre o assunto pronunciando um libelo contra o cristianismo.
“Foi sobre a ruinaria da civilização greco-romana que desabrochou a flor mórbida do pensamento cristão”, falou para os presentes.
E continuou: “A moral cristã é contra a natureza humana” e “o cristianismo é inimigo da civilização”.
Segundo o autor, Getúlio considerava que o cristianismo significava um retrocesso em relação as “grandes conquistas progressivas da humanidade”, um freio ao “ideal superior de força e energia” que teria sido legado à civilização ocidental pela cultura greco-romana.
Para ele, o cristianismo “desnatura a grandeza da sexualidade, a força propagadora da espécie, a união dos seres numa transfusão do magnetismo amoroso, considerado como um comércio impuro”.
Atuando politicamente em um país dominantemente católico, Getúlio guardou a sete chaves esse discurso. Ele foi descoberto pela família muito tempo depois da sua morte e agora está nos arquivos oficiais do ex-presidente, classificado como confidencial.
Ensino religioso
Mesmo sendo um agnóstico, Getúlio Vargas foi quem instituiu o ensino religioso nas escolas públicas (Decreto nº 19.941 de 30 de abril de 1931). Agiu assim para não sofrer desgastes políticos com os católicos.
Assinado pelo então ministro da Educação Francisco Campos, o restabelecimento do ensino religioso nos níveis primário, secundário e normal recebeu duras críticas, principalmente da escritora e jornalista Cecília Meireles.
Se referia à medida como o “decretozinho do ensino religioso” e passou a revelar que estava desapontada com os rumos da Revolução de 1930: “[…] o regime atual, que tanto tem invocado a Liberdade como a padroeira, nos coloca nas velhas situações de rotina, de cativeiro e de atraso que aos olhos atônitos do mundo proclamarão, só por si, o formidável fracasso da nossa malograda revolução…”.
Analisava que o “decretozinho provinciano” serviu para “agradar a alguns curas, e atrair algumas ovelhas”.
Com essa medida, Getúlio selou um pacto com a Igreja Católica, que tinha dúvidas sobre o caminho que o líder gaúcho tomaria.